quarta-feira, agosto 06, 2008

Diretamente de Angola


Meu amigo Paulinho (Paulo Araújo ou Francisco Paulo) está há um mês em Angola. Ele apareceu aqui no blog quando almoçamos juntos para que ele conhecesse a Haydèe, também amiga, também jornalista, que nos apresentou, mas que não o conhecia pessoalmente, apesar de amigos há loooonga data.

Chegou agora um email dele contando coisas sobre o País. Acho legal dividir com o público aqui do Efeito Pimenta, pois é bem aquela coisa de "bastidores da notícia". Ele foi trabalhar naquele jornal de economia que foi lançado lá em Angola, sabe?

Bom, deixa ele falar:

Queridos amigos,
Quase um mês depois de ter chegado aqui, envio um longo e-mail sobre as minhas impressões de Angola. Desculpe qq erro de digitação, concordância etc.
abs
Francisco Paulo
A COMIDA
Muita batata, mandioca, caldos, um tipo de pirão, feito de milho branco, chamado "funge" (a angolana está pronta para casar quando sabe fazer um bom funge), peixes à vontade, enfim, feijão, arroz, comida para quem precisa de muita energia para enfrentar jornadas exaustivas e muito calor. Nas ruas, as zungeiras (ambulantes) vendem de tudo: bananas, laranjas, abacaxis (ananás), verduras, legumes. O café é saborosíssimo (Angola já foi o quarto produtor mundial) e os doces, herança boa dos portugueses, de morrer de felicidade.
O CLIMA
De maio a setembro, a corrente marítima que vem do sul faz os angolanos viverem um tipo de inverno agradabilíssimo, chamado de "cacimbo". É preciso usar casaco à noite, o céu fica completamente cinza durante o dia e, na hora do pôr do sol, o astro-rei dá um verdadeiro espetáculo, banhando-se no mar em formato de bola de fogo amarela. Aqui é possível fitar diretamente o sol e não ficar cego. Ele é tão lindo quanto a lua, uma verdadeira "Lua Valda-Esso".
A CAPITAL
Não se sabe se são 4 ou 6 milhões os habitantes. No país todo, talvez 14 milhões, numa area do tamanho do estado do Pará. Luanda é, foi e sempre será um cidade belíssima. Uns já chamaram-na "Rio de Janeiro de África" ou a "Lisboa dos Trópicos". De fato, há uma baía majestosa, uma ilha finíssima que corre defronte e dois níveis de terreno, tal qual em Salvador, que permite-nos ver o mar de praticamente todos os sítios e esplanadas. Estamos exatamente no mesmo paralelo de Recife. Morar no centro é bom, por causa do trânsito louco. Na Zona Sul, há dezenas de condomínios fechados onde mora a maioria dos brasileiros. Lá também fica o único shopping da cidade, exatamente igual a todos os shoppings do mundo. Tem lojas da MOfficer e livraria Nobel.
A ARQUITETURA
Portuguesa, colonial, com casarios imponentes, quintas afastadas, sobrados e edifícios com toques modernistas, típico dos anos 1960. Não há uma só caixa d'água na cidade, pois aqui copiou-se a tecnologia americana de pressão hidráulica para abastecer as casas. Não havia garagens para carros. Todas essas casas, vale lembrar, foram abandonadas às pressas em 1975 e ocupadas por pessoas que nunca tinham usado pia, sanitário, elevadores etc. Tudo precisa de reparos hoje. Alguns imóveis foram demolidos pra dar lugar a prédios novos, construídos initerrupitamente dia e noite por chineses. Junte-se o trânsito caótico e as gruas, que contam-se às dezenas, e têm-se um cenário que um reporter da Folha de São Paulo um dia batizou de "Blad Runner". Nos primeiros dias, é isso exatamente que Luanda parece. Não deve haver no Brasil nada parecido – talvez o edifício San Vito, ao lado do Mercado Municipal de SP, seja apenas um pequeno ensaio de como as pessoas moram mal. Mas basta ter boa vontade e educar os olhos que as belezas começam a pulular em todos os cantos. Os azulejos, por exemplo, são tão belos ou mais do que os do Convento de São Francisco, em Salvador. Em pouco tempo, já estamos apaixonados pela cidade.
O TRANSPORTE
Não há ônibus ou taxis do tipo que conhecemos no Brasil. Ou têm-se carros (que aqui são muito baratos e das melhores marcas do mundo) ou anda-se de "candonga" um tipo de kombi da Toyota, sempre na cor azul . Andam superlotadas, em alta velocidade, e não tem escrito na frente para onde seguem. Muita coisa dá para resolver a pé.
DOENÇAS
Sofre-se muito ainda de febre amarela (Paludismo), diarréia e outros males tropicais. É preciso estar atento a higiene dos alimentos. Os mais radicais não bebem nada com gelo, com medo da procedência da água. Mosquitos infernizam a gente à noite, mas nada que um ar-condicionado ou repelente não evite.
A HISTÓRIA
Os portugueses exploraram Angola desde muito antes de "descobrir" o Brasil e assim o fizeram até 1975. Uma guerra de libertação nacional já choacoalhava o território desde 1961, levada a cabo por 3 grupos rivais queriam ficar no poder depois que os portugueses se retiraram no bojo do final da ditadura de Salazer. Não houve uma transferência de poder planejada, mais de 800 mil pessoas foram embora em menos de 1 ano, na maior ponte áerea da história da humanidade, e deixaram para trás tudo que não puderam embarcar em navios ou aviões – que pousavam no aeroporto de Luanda a cada 5 minutos e chegavam a levar até 400 passageiros só com a roupa do corpo, no corredor, nas cabinas, nos lavatórios, onde fosse possível escapar. Muitos seguiram para o Brasil. A maioria tinha nascido em Angola, nunca pusera os pés em Portugal, e foi recebida da pior forma possível na terra de D. Sebastião. Ganharam a alcunha de "retornados" e a eles se creditaram todas as mazelas que assolavam o país depois de décadas de ditadura. Duas décadas depois, foram esses "retornados", experimentados no comércio e indústria que sempre praticaram em Angola, que fizeram Portugal crescer e entrar para a Comunidade Européia. Muitos voltaram à Angola e ainda travam embates antropológicos diários com os locais. Feridas são abertas o tempo todo em bares, ruas, praias. Dia desses uma portuguesa confessou: "Se não fôssemos nós a estar cá 500 anos, estariam ainda a viver em cabanas e a usar tamancos de madeira". O povo angolano é educadíssimo, dá bom dia, obrigado e é gentil o tempo inteiro, mas dificilmente nos olha nos olhos. Sinal ainda de submissão ao branco colonizador? Gostaria que não fosse. Cuba sempre Ajudou Angola a se libertar de Portugal e a mandar medicos e professores para cá. A influência do basquete e do andebol é visível nas ruas. Futebol também é muito jogado.
OS BRASILEIROS
São imensamente amados, principalmente quando comparados com os portugueses. Angolanos sabem quase tudo sobre o nosso país. Vêem mais de cinco novelas por dia, conhecem de cor nomes de cidades e estados. Quantas províncias há por aqui? Quem é o presidente? Quem é o grande cantor ou escritor angolano? Não sabemos. Já o contrario…tem uns que citam de cor as praias da Bahia ou os bairros do Rio de Janeiro. Há quatro vôos semanais ligando o Rio a Luanda. Vão e voltam absurdamente lotados de brasileiros (que voltam ao país a cada 3 meses) e de sacoleiras que fazem a alegria dos comerciantes da 25 de Março, em SP. A passagem delas pelos freeshop do aeroporto também é aguardada com expectativa, a cada 4 dias. Brasileiros mais abertos fazem logo amizade com angolanos.
A LÍNGUA
Nem de longe falamos igual aos angolanos ou, em ultimo caso, aos portugueses. São dois idiomas completamente diferentes, cuja unificação desejada pelo acordo ortográfico não vai dar certo nunca. Brasileiros aqui descobrem que falam "errado" até não mais querer. Mas errado sob que ponto de vista? Se for o de um país-continente que cresceu mais do que todos os outros que falam a mesma lingua, criou uma música original e faz a melhor televisão do mundo, não há nada de errado. Falamos "brasileiro", esse é o ponto. Mas aqui, motoristas ou vendedores ambulantes são verdadeiros mestres no uso das próclises, ênclises e mesóclises. Se os gauchos se orgulham de conjugar o pronome "tu" no tempo verbal correto, deveriam rever esse conceito.
AS MULHERES E OS HOMENS
São belíssimos, de deixar qualquer ser humano que se esfalfa para esculpir músculos em academias deprimidíssimo. As angolanas são altas, altivas, orgulhosas da beleza natural que têm, fazem do cabelo obras de arte e estão cada dia mais influenciada pela moda difundida nas novelas brasileiras. Pernas, barriga, bunda, tudo na mais perfeita hamonia. Os homens, por seu turno, chegam à velhice parecendo o Samuel L. Jackson ou o Morgan Freeman. Os ancestrais do Denzel Washington devem ser de outra parte de África. Vê-los todos em propagandas na tv, jornal e outdoors deveria ser um estágio obrigatório para os publicitários e diretores de arte brasileiros, que teimam em retratar o Brasil negro ou mestiço que somos cada vez mais como um metáfora da Suécia.
QUE BRASILEIROS SÃO FAMOSOS AQUI?
Thais Araújo, Lázaro Ramos, Netinho, Alcione, Emílio Santiago, Alexandre Pires, Roberta Miranda, Ritchie, Ivete Sangalo. No jornal de Angola todo dia há duas ou três notas sobre nossos cantores e atores. Em novembro, a TV Globo vai trazer a Banda Calypso para dar um show aqui em comemoração ao Dia da Amizade Brasil-Angola. E por que os angolanos gostam das músicas brasileiras? "Porque somos românticos", respondeu um.
POR QUE ANGOLA ESTÁ BOMBANDO?
Por que em 2002 a guerra civil que assolava o país desde 98 cessou. De lá para cá, a economia cresce a taxas inacreditáveis de 25% ao ano, em média. Petróleo (1,9 milhão de barris/dia) e diamantes (9 milhões de quilates em 2007, sendo que só 40% das reservas foram exploradas) são as duas principais indústrias de base. Mas ainda falta tudo na indústria de transformação. Resultado: tudo que consome-se aqui, exceto pouca coisa de agricultura, é importado. É a cidade mais cara do mundo para estrangeiros de acordo com o Banco Mundial. Uma rodada de pizza com 5 amigos bate fácil nos 100 dólares – moeda corrente aqui também, além do nacional Kwanza (a cotação é de USD 75 para cada 1 Kwz). Construção civil e qualquer tipo de consultoria (obviamente de qualidade) são as demandas mais intensas no país.
A MÚSICA
Três ritmos principais. O Semba, com "esse" mesmo, mais clássico, de bom gusto, recheado de histórias sobre o país e o amor. Paulo Flores é o gande nome. Faleceu dia desses, em Paris, Teta Lando, um grande cantor que ficou anos no exílio e nunca deixou de fazer música angolana. Tem também os ritmos Kuduro, mais da juventude, e o hap, cantando em português. A propaganda da cerveja Cuca é uma das canções mais bonitas que já ouvi.
AS PRAIAS
Tão lindas e de águas claras quanto as do Nordeste.
A BALADA
Concentra-se principalmetne numa ilha estreita e comprida, defronte à baía de Luanda. Há boates, bares, ótimos restaurantes e um frenesi intenso já a partir da quinta-feira. Mas prepare-se: a cada noitada, pelo menos 100 dólares dão tchau a sua carteira se o menor remorso. Fazer baladinhas em casa, então, é o mais acertado.

13 comentários:

  1. Anônimo4:11 PM

    Meu marido tah doido pra ir. Eu num deixo!!!

    By nana

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  2. Anônimo6:07 PM

    oi,
    sou brasileiro, soteropolitano e adoraria poder contribuir com o crescimento de angola, quero participar da reconstrução, estou disponivel para ir a qualquer momento pra angola.
    Preciso de um feed back para ir com um emprego em vista, meu email é agssantana@gmail.com por favor me ajude , me oriente.

    Abraços

    Alexandre Guimarães

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  3. Olá Silvia. Nossa tive uma bela aula sobre a Angola! Fiquei curiossima para continuar acompanhando a estadia do seu amigo "Paulinho" por lá. Ele tem blog, site ou email para continuar nos contando essas impressões fantásticas? Hahahaha. Querida, por falar nisso... eu não tenho seu email, msn, skype ou qualquer coisa do tipo além do seu blog... Sempre muito bom passar por aqui. beijos...

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  4. Anônimo5:49 PM

    realmente, é mais interessante do que parece. mas ainda tem muito que crescer mesmo. igual a "nóis".

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  5. Anônimo11:09 AM

    Eu já tinha ouvido isso 15 anos atrás e fico tristemente surpresa que a infra-estrutura básica não melhorou em nada em Angola.

    www.balzacsemprozac.blogspot.com

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  6. Puxa, Sílvia,

    Muito obrigado por este texto sobre Angola... Sei tão pouco sobre esse país! Tudo o que me vem à mente quando se fala sobre o país é o livro "Os cus de Judas", de Lobo Antunes. Nunca li Mia Couto, principal autor angolano. Sinceramente, fiquei com vontade de visitar Luanda...

    Beijo e obrigado!

    Lelec

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  7. Parece um lugar encantador!
    Essas comidas são uma tentação....e essa coisa do gelo me lembrou o filme 'Babel'.
    Que inveja dos 'corpos naturalmente malhados'...eu to doida com essa gordura/celulite/estria. rs
    Ritchie é inglês. rs

    Sobre o post anterior:
    Também recebo pelos trabalhos que faço. eu adoraria ter um salario fixo (mais cachê pelos tais trabalhos heheheh).
    Espero que dê tudo certo, pode deixar que fico na torcida.

    Beijos

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  8. Anônimo11:12 AM

    Que maravilha de post!!! Quero muito conhecer Angola. Meu cunhado esteve lá recentemente e tirou fotos interessantíssimas.

    Agora, pô, vê se dá uma ajuda pro Alexandre aí acima, ele pediu com tanta educação...

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  9. Anônimo3:40 PM

    Olá a todos! Eu estou em Angola e estou adorando conhecer esse país, cultura, povo...

    Há muito o que se fazer por aqui.. sem duvida! Mas muito ja foi e esta sendo feito!

    O transito daqui uns meses melhorará bastante pois o governo esta investindo muito em rodovias!

    Admiro a dedicacao do Presidente Jose Eduardo, abdicou de sua vida e liberdade em busca de um novo futuro pra esse povo, tem muita aceitacao da massa aqui.
    Povo esse sofrido mas que tras um belo sorriso no rosto!

    Um abraco a todos! Gostei muito do texto!

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  10. Oi pessoal,gostei imenso deste relato bem detalhado da minha terra,ate vieram-me lagrimas aos olhos pois sinto muita falta daquilo tudo!
    O Paulo parece ter caido nos encantos de Angola e n é para menos pois aquela terra é muito especial e nem todo mundo leva tempo para conhece-la e descobrir as suas maravilhas!
    Mas queria so corrigir uma pessoa que disse aqui que Mia Couto é dos melhores escritores angolanos,primeiro,Mia Couto é Mocambicano e segundo o melhor autor Angolano chama-se Pepetela!


    Um grande abraco!

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  11. Achei ótimo o email do seu amigo Paulo.... estou em Luanda desde fevereiro e leio semanalmente o jornal em que seu amigo trabalha.... afinal sou economista! kkkk

    Se ele estiver por aqui ainda, por favor, passe meu contato pra ele... pareceu-me um cara bacana e aberto a conhecer a verdadeira realidade dos angolanos... muito diferente da maioria dos brasileiros que cá estao.... que vivem procurando um Brasil em Luanda..... pcamuri@hotmail.com

    Abraços e parabéns pelo blog.... ahh o meu é pauloemluanda.criarumblog.com

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  12. Anônimo5:01 PM

    Olá
    Quero muito ir trabalhar na reconstrução de Angola tenho um primo que ja está trabalhando lá como operador de máquinas por favor preciso também de um feed back para eu ir com um emprego em vista,tenho disponibilidADE para ir,meu email é elzyy@ig.com.br
    Por favor tenho interesse em trabalhar lá em Angola,aguardo resposta.

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  13. Anônimo8:22 AM

    Olá, sou brasileira e gostaria muito de trabalhar na angola, por favor me ajude...Meu email renata.greyce@hotmail.com


    Aguardo resposta...

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